Chapter 2: O Perigo da Vulnerabilidade Alterada Randal apenas olhou para Matt, sentindo o peso da promessa quebrada. Matt não tinha conseguido esperar nem dez minutos. O frasco estava agora escondido debaixo do travesseiro. Matt tentava disfarçar a mudança, mas Randal percebia a euforia química começando a surgir. Aquele brilho fugaz de sobriedade havia desaparecido, substituído pela névoa familiar que Randal tanto detestava. Matt forçou um sorriso, claramente desconfortável sob o olhar fixo de Randal. “O que foi? Vamos. Estou com fome,” Matt disse. Randal respirou fundo, engolindo a decepção. Não adiantava confrontá-lo agora. Matt já estava se distanciando, a substância criando uma barreira entre eles. Randal tinha que mudar a estratégia, tinha que adiar o confronto e focar em aproveitar o tempo limitado. Matt, mesmo alterado, ainda era Matt. Randal queria estar perto dele. “Tudo bem,” Randal disse, sua voz controlada. Não havia raiva, apenas um silêncio carregado que, Randal tinha certeza, Matt entendia perfeitamente. “Vamos sair. Eu quero café de verdade, e não o instantâneo que a gente tem.” Matt acenou com a cabeça. Matt parecia ansioso para sair do apartamento, para se afastar da cena do crime, embora Randal soubesse que Matt não se considerava culpado. Randal pegou a carteira e as chaves. Ele deu uma última olhada no quarto bagunçado. A bagunça, a sujeira, tudo isso parecia insignificante perto da bagunça que Matt estava fazendo com a própria vida. Randal queria consertar Matt, mas Matt não queria ser consertado. Eles saíram do quarto e atravessaram a sala de estar. A cena era horrível, como Randal havia descrito. Copos plásticos esmagados, migalhas de comida, e o cheiro enjoativo de álcool velho pairava no ar. Randal sentia uma pontada de ressentimento. Ele sempre limpava. Ele sempre lidava com as consequências do caos de Matt. Matt andou na frente, sem sequer registrar o estado do apartamento. Parecia completamente imune ao ambiente que ele mesmo criava. Randal fechou a porta atrás deles, deixando o desastre para trás. O sol da manhã era forte, e o ar fresco contrastava com o cheiro abafado do apartamento. Matt, com seu cabelo verde, moletom e camiseta preta, se destacava na rua. As pessoas que passavam olhavam para Matt, algumas com reconhecimento, outras com curiosidade. Randal notou que Matt se encolhia levemente sob os olhares, um sinal de seu conhecido desprezo pela fama. “Vamos à cafeteria perto da biblioteca,” Randal sugeriu. Era um lugar calmo, com mesas ao ar livre, onde eles poderiam conversar sem a música alta e o tumulto usual do campus. Matt concordou, ajustando o capuz da blusa sobre o cabelo. “Parece bom. Preciso de cafeína para aguentar o seu dia de sobriedade, mesmo que eu tenha quebrado o acordo,” Matt disse, e Randal notou que Matt usava a ironia como escudo. Randal escolheu não responder à provocação. O silêncio de Randal era uma punição, e ele sabia que Matt o sentia. Eles caminharam em silêncio por alguns minutos. Randal observava Matt. A euforia que Randal havia detectado minutos antes estava crescendo. Matt estava mais expansivo, movendo as mãos enquanto falava, embora ainda não tivesse falado muito. Chegaram à cafeteria. Era um lugar pequeno, aconchegante, frequentado principalmente por estudantes de Letras, o que era irônico, já que Matt estava ali. Randal e Matt se sentaram em uma mesa externa. Uma garçonete veio até eles. Randal pediu um café forte e um croissant. Matt pediu um expresso duplo e um copo de água. Assim que a garçonete se afastou, Matt se inclinou na mesa, apoiando o queixo nas mãos. Matt olhou para Randal, e havia uma intensidade estranha no olhar dele. “Você está chateado,” Matt afirmou, sem perguntar. Randal pegou um guardanapo e começou a dobrá-lo metodicamente. “Eu propus um desafio. Você aceitou. E quebrou o acordo antes de eu sair do banheiro,” Randal disse, mantendo o tom neutro. Ele não queria explodir. Não agora. Matt desviou o olhar por um momento, mas voltou a encarar Randal. “É difícil, Randal. Você não entende.” “Eu entendo que você nem sequer tentou, Matt. Esse é o problema,” Randal corrigiu. Matt soltou um suspiro, mas não pareceu irritado. A substância que ele havia usado parecia estar suavizando suas defesas, tornando-o estranhamente maleável, quase vulnerável. Essa vulnerabilidade era o que Randal buscava, mas o fato de ela vir acompanhada da alteração química era um lembrete cruel. “Eu não conseguiria passar vinte e quatro horas na minha cabeça, Randal. Não sem a ajuda,” Matt admitiu. Matt falava com uma sinceridade dolorosa, algo que Matt só fazia quando estava totalmente lúcido ou, curiosamente, quando estava começando a sentir os efeitos de algo. Randal olhou para as mãos de Matt. “Eu não pedi que você fizesse isso por mim. Pedi que fizesse por você.” A garçonete trouxe os pedidos. O cheiro do café era agradável. Matt pegou o expresso e bebeu metade de uma vez. Ele fez uma careta, mas o líquido parecia dar-lhe o impulso que ele buscava. Matt colocou a xícara na mesa. Ele pegou o copo de água, mas apenas brincou com ele. “Você quer saber por que eu odeio tanto a fama?” Matt perguntou, mudando de assunto abruptamente. Randal assentiu. Ele sabia que Matt era um músico talentoso, conhecido no cenário underground, mas Matt sempre evitava o assunto. Quando Matt estava lúcido, ele apenas dizia que era ‘besteira’ e que ‘não significava nada’. “Eu fiz algumas músicas quando tinha dezesseis anos. Coisas idiotas, letras sobre garotas e como a escola era chata,” Matt começou. Matt falava baixo, mas a voz carregava uma carga emocional que Randal nunca tinha ouvido antes. Randal sentou-se quieto, observando Matt. Essa era a versão de Matt que Randal perseguia, a que revelava camadas, a que era honesta sobre suas dores. Era uma pena que viesse tingida de euforia química. “Eu lancei as músicas na internet, meio que por brincadeira. E elas explodiram. Do nada. Fiquei conhecido como ‘Matt Green Hair’ antes de ter cabelo verde. O nome veio depois, quando comecei a pintar para parecer menos com o ‘garoto-prodígio’ que as pessoas esperavam,” Matt explicou. Matt tocou o cabelo, a cor vibrante contrastando com a palidez de sua pele. Randal nunca tinha ouvido a história completa. Ele sabia sobre a fama, mas não os detalhes. “O problema não era a música em si. O problema era o que veio depois. As pessoas. Elas não queriam a música. Queriam o ‘fenômeno Matt’. Queriam saber quem eu era, o que eu comia, com quem eu saía,” Matt continuou. Matt parecia reviver o momento, a lembrança o incomodava profundamente. “Eu tinha dezessete anos e já estava em turnê. Minha família viu nisso uma oportunidade. Não para mim, mas para eles,” Matt disse, e a voz de Matt endureceu. “Meu pai, especialmente. Ele sempre quis ser músico, mas nunca conseguiu. Eu me tornei o projeto dele. A fonte de renda. O orgulho que ele podia exibir.” Randal sentiu um arrepio. Ele sabia que a relação de Matt com a família era tensa, mas não o quão exploradora era. “Ele me forçava a escrever, a compor, a ir a festas com pessoas que eu nem conhecia. Eu era uma máquina de fazer dinheiro, Randal. Não um filho. Não um adolescente,” Matt desabafou. Matt pegou o copo de água e bebeu um longo gole. “E você odiava isso,” Randal afirmou, mais uma compreensão do que uma pergunta. “Eu odiava a vida que ele construiu para mim. A música se tornou uma obrigação, um peso. E a fama… a fama era a coleira que me prendia a ele,” Matt explicou. Matt esfregou a têmpora. “Eu comecei a usar coisas para aguentar. Para conseguir ir aos shows, para sorrir nas entrevistas. Para parecer o Matt legal e rebelde que eles queriam.” Randal olhou para o Matt sentado à sua frente. Matt não era rebelde. Matt era apenas um cara ferido que tentava se esconder do mundo. “Você nunca me contou isso. Você sempre diz que só odeia a fama porque é barulhenta,” Randal observou. Matt sorriu tristemente. “É mais fácil mentir sobre o motivo. Dizer que odeio o barulho do que admitir que fui explorado. Dizer que sou caótico porque quero, e não porque é a única maneira que encontrei para escapar.” Randal pegou a mão de Matt, que estava sobre a mesa. Matt não puxou a mão de volta. Matt apenas olhou para a mão de Randal, surpreso com o gesto. Randal apertou levemente, tentando transmitir o apoio que não conseguia expressar com palavras. “Então, a bagunça, as festas, tudo isso é a sua maneira de sabotar o ‘projeto Matt’?” Randal perguntou, tentando juntar as peças do quebra-cabeça caótico que era Matt. “Sim. Se eu for o viciado, o irresponsável, o bagunceiro, ninguém vai querer me contratar. Ninguém vai querer meu ‘talento’. Eu destruo a minha imagem para ter paz,” Matt admitiu. Matt virou a mão e apertou a de Randal de volta. Era um toque incomumente íntimo para Matt, fora do contexto do quarto bagunçado. Randal estava chocado. Ele sabia que Matt tinha problemas, mas a profundidade do ressentimento e da autossabotagem era nova. Matt estava se destruindo ativamente para não ser o que os outros queriam que ele fosse. “Você está em Letras, Matt. Você está tentando escrever. Isso não é sabotagem,” Randal disse. “Letras é o meu refúgio. É o que eu amo de verdade. Mas não é famoso, Randal. Não me rende dinheiro. Não é lucrativo. Meu pai odeia que eu esteja aqui. Ele queria que eu estivesse fazendo música pop idiota,” Matt explicou. Matt pegou um croissant de Randal e deu uma mordida, parecendo mais à vontade agora que tinha compartilhado o segredo. “E o que você escreve, quando está lúcido, é incrível. Você tem talento, Matt. Não no sentido que eles querem, mas no sentido real,” Randal disse. Ele tinha lido os rascunhos de Matt, os poemas e as tentativas de romance. Eram textos densos, cheios de emoção. Matt riu, um som melancólico. “Obrigado, Randal. Você é o único que me diz isso. Todo mundo só quer saber se eu vou lançar o próximo single.” Randal tirou a mão da de Matt, pegou o café e bebeu um gole. Matt parecia completamente diferente agora. Estava aberto, vulnerável, e Randal via a pessoa incrível que ele sempre soubera existir. Mas essa pessoa só estava aparecendo porque Matt estava alterado. O pensamento era amargo. “Então, por que você não para? Você está na faculdade, Matt. Você tem dezoito anos. Você pode se afastar do seu pai. Você pode simplesmente dizer não à música,” Randal questionou. Matt suspirou. Matt começou a brincar com a xícara vazia de expresso. “Não é tão simples. Eles me ameaçam. Com dinheiro, com processos. Eu ainda estou preso a contratos que assinei quando era menor. E, para ser sincero, o caos se tornou confortável. É a minha zona de conforto,” Matt admitiu. Matt olhou para Randal. “E eu tenho medo de falhar na única coisa que eu realmente amo. Se eu não for um músico famoso, e falhar como escritor, o que me resta?” Randal viu o medo nos olhos de Matt. Era um medo genuíno, o medo do vazio, da falta de propósito. “Resta você, Matt. A pessoa que você é quando não está tentando fugir de si mesmo,” Randal respondeu, a voz carregada de convicção. Randal queria que Matt visse o que ele via. Matt balançou a cabeça. “Não. Não resta nada. Por isso eu fujo. E por isso eu não consegui manter o desafio. A sobriedade é muito barulhenta na minha cabeça. Os pensamentos, o medo, o ressentimento. É insuportável.” Randal sentiu uma profunda tristeza por Matt. Matt estava vivendo uma vida de autopunição, uma prisão autoimposta. Matt se inclinou mais perto, falando em um tom mais baixo, quase conspiratório. “Você me entende, Randal. Você vê além do cabelo verde e das festas. Por que você se importa tanto?” Randal hesitou. Ele não podia dizer a Matt que o amava. Matt não estava pronto para isso. Matt mal conseguia lidar com a própria existência, muito menos com os sentimentos de Randal. “Eu me importo porque vejo o potencial. Vejo o que você poderia ser. E porque você é meu colega de quarto. E porque eu gosto de você, Matt. Gosto de você de verdade,” Randal confessou, usando as palavras mais seguras que conseguia encontrar. Matt sorriu, um sorriso genuíno que Randal raramente via. O sorriso alcançou os olhos de Matt, fazendo-os brilhar um pouco mais. Matt estava claramente gostando da atenção, da confissão de Randal. A euforia química estava amplificando a necessidade de Matt de ser visto e validado. Matt estendeu a mão novamente e tocou o braço de Randal. Matt começou a traçar círculos lentos na pele de Randal. O gesto era carinhoso, quase íntimo demais para o ambiente. Randal sentiu um calor se espalhar pelo corpo, uma reação automática à proximidade de Matt. “Eu gosto de você também, Randal. Você é o meu âncora no meio do furacão. O único que limpa a minha bagunça,” Matt disse, e havia uma leve brincadeira na voz dele, mas Randal sabia que havia verdade na afirmação. Randal tentou ignorar a mão de Matt no braço dele. A vulnerabilidade de Matt era uma isca poderosa, e Randal estava mordendo-a de bom grado. “Então, se você gosta de mim, e sabe que eu me preocupo, por que continuar com o caos?” Randal perguntou, tentando trazer Matt de volta à realidade, mesmo que a realidade de Matt fosse tênue no momento. Matt suspirou, tirando a mão do braço de Randal. Matt pegou o expresso vazio e o girou na mesa. “É uma luta, Randal. É uma luta que eu perco todos os dias. Eu acordo, e a primeira coisa que a minha mente diz é ‘fugir’. E as pílulas, o álcool, a maconha, eles me dão a licença para ser irresponsável. Para não ser o garoto-prodígio, mas o desastre. É o meu protesto pessoal,” Matt explicou. Matt estava articulando seus pensamentos com uma clareza que Randal associava à sobriedade, mas Randal sabia que isso era o efeito da substância, dando a Matt uma coragem temporária. Randal percebeu que a substância não estava apenas nublando Matt; estava também, ironicamente, forçando-o a ser honesto. Era um paradoxo cruel. A única maneira de Matt se abrir era fugindo da realidade. “Eu não quero que você se destrua, Matt. Eu quero a versão de você que eu vejo agora, a que consegue falar sobre o que sente, a que não está se afogando na bagunça,” Randal disse. Matt olhou para Randal, e Matt parecia genuinamente tocado. “Você está sendo muito bom para mim, Randal. Eu não mereço isso. Eu sou um problema. Eu sou um desastre.” “Eu decido o que você merece,” Randal disse, sua voz firme. Randal queria abraçar Matt, protegê-lo do mundo e dele mesmo. Eles ficaram em silêncio por um momento, apenas absorvendo o peso da conversa. Randal tomou o último gole do café. “Então, qual é o próximo passo para o nosso ‘dia normal’?” Matt perguntou, tentando trazer leveza à situação. Randal pensou rapidamente. O plano original era a livraria ou a tese, mas Matt parecia estar em um estado de espírito que pedia algo mais íntimo. “Vamos ao parque. Podemos apenas caminhar. E você pode me contar mais sobre o que está escrevendo para a sua tese,” Randal sugeriu. Matt sorriu. “O parque. Eu gosto disso. É tranquilo. E eu não tenho que fingir que sou um aluno modelo.” Randal pagou a conta e eles se levantaram. Enquanto caminhavam em direção ao parque, Matt estava mais falante do que Randal jamais o tinha visto. Matt começou a falar sobre a tese, que era sobre a literatura do absurdo e como ela se relacionava com a cultura pop. “Eu estou obcecado com Camus,” Matt disse. “A ideia do absurdo, de que a vida não tem um significado inerente, mas que devemos abraçar isso e encontrar o nosso próprio significado.” “E como isso se encaixa na cultura pop?” Randal perguntou, genuinamente interessado. “A cultura pop é o nosso Sisifo moderno. A repetição infinita de conteúdo, a busca por algo novo que é sempre igual. E a gente continua rolando a pedra,” Matt explicou. Matt gesticulava com as mãos enquanto falava, a paixão pela literatura clara em sua voz. Randal admirava essa versão de Matt. Inteligente, articulado, e apaixonado por algo que não era destrutivo. Matt tinha uma mente brilhante que Randal queria desesperadamente resgatar. Eles chegaram ao parque. Era um lugar grande, com muitas árvores e caminhos pavimentados. O sol estava quente, mas a brisa era fresca. Enquanto caminhavam, Matt continuou falando sobre o absurdo. Ele começou a misturar a teoria com a própria vida, algo que Matt só fazia quando estava vulnerável. “Eu sou o meu próprio absurdo, Randal. Eu estou vivendo uma vida que eu odeio, mas eu continuo fazendo isso. Eu sou o Sisifo que continua rolando a pedra para cima, sabendo que ela vai cair,” Matt disse, olhando para as árvores. “Mas você não precisa rolar a pedra, Matt. Você pode deixá-la rolar e ir para outro lugar,” Randal argumentou. Matt parou de andar e se virou para Randal. Matt olhou profundamente para Randal, e havia uma dor genuína em seus olhos. “Você me faz querer parar de rolar a pedra, Randal. Você me faz querer tentar a sobriedade. Mas eu não sei como viver sem o caos. Eu não sei quem eu sou sem o desastre,” Matt confessou. A proximidade de Matt era intensa. Randal sentiu a atração aumentar. Matt estava tão aberto, tão exposto. Randal sabia que esse era o momento que ele esperava, a chance de se conectar com o verdadeiro Matt. “Você é o cara que entende Camus. Você é o cara que escreve letras de música que não são idiotas. Você é o cara que limpa a própria bagunça quando está lúcido,” Randal disse, listando as qualidades que ele via em Matt. Matt sorriu, e desta vez o sorriso era mais leve. “Eu te dou muito crédito, Randal.” Matt se aproximou ainda mais. Matt levantou a mão e tocou o rosto de Randal, deslizando o polegar suavemente pela bochecha de Randal. Era um toque carinhoso, algo que nunca acontecia a não ser em momentos de intensa paixão. Randal fechou os olhos por um instante, aproveitando o momento raro. Ele sentia a vulnerabilidade de Matt como uma corrente elétrica. “Você é um perigo para o meu protesto,” Matt sussurrou, a voz dele estava um pouco mais rouca agora, a euforia química estava atingindo o seu pico. Matt se inclinou e beijou Randal, um beijo suave, mas carregado de intenção. Randal retribuiu, envolvendo Matt em seus braços. Randal sabia que Matt estava beijando-o por causa da substância, por causa da vulnerabilidade induzida, mas Randal não se importava. Era o Matt que ele amava, a pessoa aberta e honesta, mesmo que essa honestidade fosse temporária. Eles se separaram. Matt estava ofegante, olhando para Randal com uma mistura de adoração e desespero. “O que a gente faz agora?” Matt perguntou, a voz quase inaudível. Randal sabia que precisava manter Matt focado, longe de qualquer tentação de voltar para casa ou se afundar mais. “Vamos continuar andando. Me conte mais sobre a sua tese. Me conte sobre o livro que você está tentando escrever,” Randal disse. Randal queria manter Matt falando, mantendo a mente dele ocupada. Eles voltaram a caminhar. Matt, revigorado pelo beijo e pela substância, continuou a falar sobre literatura e a vida. Randal ouvia, absorvendo cada palavra. Ele estava vivendo o dia que ele tinha proposto, o dia de sobriedade, mesmo que fosse uma sobriedade falsa. Randal observava Matt. Matt parecia feliz, ou pelo menos, menos atormentado. A vulnerabilidade de Matt era um presente, mas também uma maldição. Randal percebia o perigo. Matt estava tão aberto, tão carinhoso, apenas porque estava sob a influência de algo. Randal estava perseguindo uma sombra. A pessoa que Matt era agora, a pessoa que Randal amava, era uma construção química. A sobriedade de Matt era o que Randal buscava, mas essa versão, a mais íntima, só vinha quando Matt fugia da realidade. Randal sentia que estava se apaixonando pelo sintoma, não pela cura. O amor de Randal por Matt era intenso, mas Randal sabia que a luta seria muito mais longa e difícil do que ele imaginava. Matt estava disposto a se abrir, mas apenas se a dor da sobriedade fosse temporariamente mitigada. Randal sentiu um aperto no peito, a percepção de que Matt estava oferecendo a Randal o que ele queria, mas de uma forma que Matt não conseguia sustentar. Randal segurou a mão de Matt enquanto caminhavam, apreciando a proximidade. Matt era uma contradição: caótico e brilhante, destrutivo e sensível. Randal estava disposto a lutar por essa contradição, mas Matt precisava querer lutar também. Randal olhou para Matt, que estava rindo de algo que tinha dito. Aquele riso era precioso. Randal queria congelar o momento. Ele sabia que o efeito da substância passaria, e Matt voltaria a se fechar, a se esconder atrás da névoa. Randal precisava aproveitar cada segundo, cada palavra, cada toque. Ele estava perseguindo a versão de Matt que Matt só permitia que ele visse sob a influência. Randal apertou a mão de Matt, sentindo a conexão. Ele percebia o quão perigoso era estar tão perto de Matt, enquanto Matt estava tão aberto, apenas para perceber que a pessoa que ele tanto admirava era, naquele momento, uma sombra induzida. Randal percebia que ele precisava de um plano melhor, um plano que não dependesse da sobriedade forçada ou da vulnerabilidade química. Ele precisava de Matt por inteiro, mas Matt não estava inteiro. Randal continuou caminhando, a mão de Matt na dele. Ele sabia que o dia terminaria, e a luta recomeçaria, mas, por enquanto, ele tinha Matt, a versão vulnerável e aberta. Ele sabia que estava apaixonado por essa sombra. Ele olhou para Matt. Matt parecia em paz. Matt se inclinou e disse algo sobre a tese, mas Randal não registrou as palavras. Ele estava muito ocupado observando Matt, o perigo de se apaixonar por essa abertura temporária sendo real. Matt estava sendo carinhoso e Randal estava absorvendo tudo. Randal sabia que a luta para trazer o Matt lúcido e completo para a superfície seria uma guerra. Randal estava pronto para essa guerra. Matt se virou para Randal, e Matt parecia procurar validação. Randal sorriu. Ele estava com Matt. Isso era tudo o que importava. Por enquanto. Randal sentia a euforia de Matt, e sabia que essa euforia era o que permitia a Matt ser tão honesto. Ele estava perseguindo uma sombra. Randal sabia disso, mas ele não conseguia parar. A mão de Matt ainda estava na dele, e Randal sentia o calor do toque. Matt olhou para Randal, e Matt parecia estar em um lugar muito distante. Ele estava aberto. Ele estava vulnerável. Matt era um livro aberto, mas o livro estava escrito em tinta temporária. Randal estava absorvendo a vulnerabilidade. Ele percebia que o perigo era real. Randal estava apaixonado pela sombra.

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