Chapter 5: O Teste e a Confirmação
Randal não respondeu imediatamente. Ele continuou olhando para as marcas. Depois para o rosto dela como um todo. Procurando semelhanças talvez. Tentando determinar se essa criança poderia realmente ser sua irmã.
Mello esperou. Segurou a mão de Sofia e esperou para ver o que Randal faria.
Um técnico apareceu na porta do laboratório antes que alguém pudesse dizer mais alguma coisa.
"Von Ivory?" ele chamou olhando para um tablet na mão. "Podemos começar agora."
Randal assentiu sem tirar os olhos de Sofia. Ele virou-se e seguiu o técnico para dentro. Mello pegou Sofia no colo e foi atrás deles.
O laboratório era pequeno e impessoal. Paredes brancas, equipamentos de aço inoxidável, o cheiro de desinfetante no ar. Havia duas cadeiras no centro da sala e uma mesa pequena com materiais organizados.
O técnico fechou a porta atrás deles e foi para a mesa.
"O procedimento é simples," ele explicou enquanto organizava os materiais. "Vou coletar amostras de saliva de ambos usando cotonetes estéreis. Demora menos de um minuto para cada pessoa. Os resultados devem estar prontos em cinco dias úteis."
Sofia se agarrou ao pescoço de Mello assim que viu os cotonetes. Ela não gostava de hospitais ou clínicas. Qualquer lugar que cheirasse a desinfetante a deixava nervosa desde que tinha se machucado alguns meses atrás e precisou levar pontos.
"Não quero," Sofia disse baixinho no ouvido dele.
"Vai ser rápido," Mello respondeu. "Não vai doer."
"Não quero," ela repetiu mais alto dessa vez.
O técnico se aproximou com um dos cotonetes. Sofia começou a chorar e escondeu o rosto no ombro de Mello.
"Sofia," Mello disse tentando acalmá-la. "Preciso que você seja corajosa agora."
"Não!"
Ela começou a gritar de verdade. O técnico parou a alguns passos de distância com uma expressão de quem já tinha lidado com crianças difíceis antes.
"Podemos tentar com ela primeiro ou depois," ele ofereceu. "Às vezes ajuda se a criança vê um adulto fazendo primeiro."
Randal tinha ficado quieto até agora observando a interação. Ele olhou para o técnico.
"Faça o meu primeiro."
O técnico assentiu e indicou uma das cadeiras. Randal sentou e abriu a boca quando instruído. O técnico passou o cotonete na parte interna da bochecha dele por alguns segundos. Colocou o cotonete em um tubo estéril e etiquetou.
"Pronto," o técnico disse. "Sua vez agora pequena."
Sofia ainda estava escondida no ombro de Mello. As lágrimas molhavam a camisa dele.
Mello sentou na segunda cadeira mantendo Sofia no colo. Ele ajeitou ela de forma que pudesse ver o rosto dela.
"Olha para mim," ele disse baixinho.
Sofia abriu os olhos vermelhos de tanto chorar.
"Vai ser igual ao que o homem fez," Mello explicou. "Ele vai passar um palitinho dentro da sua boca. Não vai doer. Vai fazer cócegas talvez mas não vai doer."
"Não quero," Sofia repetiu mas com menos convicção dessa vez.
"Eu sei. Mas precisa ser feito. Você consegue ser corajosa por mim?"
Sofia olhou para ele por um longo momento. Depois olhou para o técnico que esperava pacientemente com o cotonete.
"Vai ficar comigo?"
"Vou ficar aqui segurando você o tempo todo," Mello prometeu.
Sofia hesitou mais alguns segundos antes de assentir muito devagar. Mello ajustou a posição dela no colo de forma que ela ficasse de frente para ele. O técnico se aproximou por trás.
"Abre a boca bem grande," o técnico instruiu.
Sofia abriu a boca mantendo os olhos fixos em Mello. O técnico passou o cotonete rapidamente. Sofia fez uma careta mas não chorou dessa vez.
"Pronto," o técnico disse colocando o segundo cotonete em outro tubo. "Foi muito corajosa."
Sofia imediatamente escondeu o rosto no ombro de Mello de novo. Ele segurou ela enquanto o técnico terminava de etiquetar as amostras.
"Os resultados vão estar prontos em cinco dias úteis," o técnico repetiu. "Vamos contatar vocês por telefone assim que tivermos os resultados."
Randal levantou da cadeira.
"Quero os resultados enviados para mim primeiro," ele disse. O tom não deixava espaço para discussão.
O técnico olhou para Mello como se esperasse que ele discordasse. Mello apenas deu de ombros. Não importava quem recebesse os resultados primeiro. O importante era saber a verdade.
"Claro," o técnico concordou. "Enviaremos para o senhor Von Ivory primeiro."
Randal assentiu e saiu do laboratório sem dizer mais nada. Mello esperou até que a porta fechasse antes de levantar com Sofia ainda no colo.
Eles saíram do prédio alguns minutos depois. Sofia tinha parado de chorar mas ainda estava agarrada a ele. Mello começou a caminhar na direção da parada de ônibus quando seu celular vibrou no bolso.
Era um e-mail de Randal. Mello parou de andar e abriu a mensagem com uma mão enquanto segurava Sofia com a outra.
"Preciso entender melhor a situação antes dos resultados ficarem prontos. Podemos nos encontrar amanhã às 14h? Há um café na Rua Augusta número 847."
Mello releu a mensagem duas vezes. Randal queria se encontrar antes dos resultados. Provavelmente queria fazer perguntas. Verificar se a história de Mello era consistente. Talvez procurar buracos na narrativa.
Ele respondeu:
"Posso ir mas Sofia vem comigo. Não tenho com quem deixá-la."
A resposta de Randal chegou quase imediatamente:
"Tudo bem. Até amanhã."
Mello guardou o celular e continuou caminhando. Sofia tinha relaxado no colo dele e estava quase dormindo. O teste tinha a deixado exausta.
O resto do dia passou sem eventos. Sofia acordou durante a viagem de ônibus para casa mas ficou quieta. Ela comeu pouco no jantar e foi dormir cedo.
Mello passou a noite pesquisando sobre Randal Von Ivory. Queria estar preparado para o encontro do dia seguinte. Descobriu que Randal tinha vinte e seis anos. Formado em administração pela melhor universidade particular do país. Assumiu controle da empresa da família depois que o pai morreu. Os artigos descreviam ele como "competente mas reservado" e "focado nos negócios acima de tudo".
Não havia nada sobre vida pessoal. Nenhuma foto com namoradas ou namorados. Nenhuma menção a amigos próximos. Randal parecia viver exclusivamente para o trabalho.
Mello foi dormir tarde pensando em que tipo de perguntas Randal faria no dia seguinte.
Na manhã seguinte Sofia acordou de mau humor. Ela reclamou da comida no café da manhã. Reclamou das roupas que Mello escolheu para ela vestir. Reclamou que estava com calor depois que ele a vestiu.
"Você está impossível hoje," Mello disse enquanto trocava a roupa dela pela terceira vez.
"Não gosto dessa também," Sofia respondeu fazendo bico.
"Sofia. Você precisa usar alguma coisa. Não pode sair pelada."
"Por que não?"
Mello respirou fundo contando até dez mentalmente. Discutir com uma criança de três anos sobre a necessidade de usar roupas em público não estava na lista de coisas que ele queria fazer hoje.
"Porque é contra a lei," ele disse finalmente. "E porque está frio lá fora."
Sofia pensou sobre isso por um momento antes de concordar relutantemente em vestir um vestido amarelo que ela geralmente gostava.
O resto da manhã foi igualmente difícil. Sofia estava grudenta e irritada. Ela queria atenção constante mas reclamava de tudo que Mello tentava fazer com ela.
Às 13h30 eles saíram do apartamento para ir ao café. Sofia reclamou durante todo o caminho. Estava muito sol. Seus sapatos estavam desconfortáveis. Ela estava com sede. Estava com fome. Queria ir para casa.
Mello comprou um suco para ela em um mercadinho no caminho na esperança de que isso a acalmasse. Funcionou por aproximadamente cinco minutos antes que ela começasse a reclamar de novo.
O café na Rua Augusta era pequeno e tinha decoração minimalista. Paredes brancas, mesas de madeira clara, plantas penduradas no teto. Randal já estava lá quando eles chegaram. Sentado em uma mesa no fundo com uma xícara de café preto na frente dele.
Ele olhou para cima quando Mello entrou com Sofia. Acenou indicando a mesa. Mello caminhou até lá e sentou na cadeira oposta mantendo Sofia no colo porque ela se recusou a sentar na própria cadeira.
"Obrigado por vir," Randal disse. O tom era formal e educado. Como se estivessem em uma reunião de negócios.
"Você pediu," Mello respondeu.
Uma garçonete se aproximou para pegar o pedido deles. Mello pediu um café e um chocolate quente para Sofia. Randal dispensou a garçonete dizendo que já tinha o que precisava.
Sofia estava inquieta no colo de Mello. Ela mexia nas mãos dele e olhava ao redor do café com curiosidade que durava aproximadamente três segundos antes que ela ficasse entediada de novo.
Randal esperou até a garçonete trazer as bebidas antes de começar a falar.
"Quero entender como você encontrou ela," ele disse direto ao ponto. "E como foram esses três anos."
Mello tinha previsto essa pergunta. Tinha preparado uma versão editada da história que omitia certos detalhes sobre seu passado como terrorista.
"Encontrei ela em uma caixa de papelão em um galpão abandonado," ele começou. "Estava trabalhando na área e ouvi ela chorando. Quando encontrei ela estava sofrendo de hipotermia. Levei para casa porque não tinha sinal no celular para ligar para emergência."
Sofia puxou a manga da camisa dele.
"Mamãe, quero ir embora."
"Daqui a pouco," Mello disse baixinho. "Preciso terminar de conversar."
Sofia fez bico mas ficou quieta por enquanto. Randal observou a interação com expressão neutra antes de voltar a atenção para Mello.
"Por que não a levou para um hospital depois?"
"Pensei em fazer isso," Mello admitiu. "Mas continuei adiando. Uma semana virou duas. Duas viraram um mês. Quando percebi já tinha me apegado a ela."
"E decidiu ficar com ela."
"Sim."
"Como conseguiu os documentos?" Randal perguntou. "Certidão de nascimento. Documentos que a listam como sua filha."
Mello tinha esperado essa pergunta também. Sabia que não podia mentir porque Randal provavelmente já tinha verificado os documentos.
"Conheço pessoas que providenciam documentação," ele disse. "Paguei por documentos que me listam como pai dela."
Randal tomou um gole do café. Os olhos dele não deixaram o rosto de Mello.
"Isso é ilegal."
"Sim."
"Você cometeu um crime para ficar com ela."
"Vários crimes tecnicamente," Mello corrigiu. "Falsificação de documentos. Não reportar uma criança abandonada às autoridades. Assumir custódia sem permissão legal."
Sofia começou a mexer de novo. Ela pegou a xícara de chocolate quente e tomou um gole. Fez uma careta porque estava muito quente.
"Espera esfriar," Mello disse pegando a xícara da mão dela antes que se queimasse.
"Mas quero agora!"
"Vai queimar sua boca. Espera mais um pouco."
Sofia cruzou os braços e olhou para ele com raiva. Mello ignorou e voltou a atenção para Randal que continuava observando eles.
"Você trabalha com o que?" Randal perguntou mudando de assunto.
"Consultoria de segurança," Mello respondeu. Era a verdade técnica. Ele fazia trabalho freelance como hacker testando sistemas de segurança para empresas.
"Isso paga o suficiente para sustentar vocês dois?"
"Paga o suficiente."
Randal não pareceu convencido mas não pressionou mais sobre o assunto. Em vez disso ele fez outra pergunta:
"Como foi cuidar de um bebê? Você tinha experiência prévia?"
"Nenhuma," Mello admitiu. "Aprendi conforme ia. Internet ajudou muito. Artigos sobre como trocar fraldas, como preparar mamadeira, o que fazer quando bebês choram."
"Deve ter sido difícil."
"Foi."
Sofia puxou a manga dele de novo.
"Mamãe, posso tomar o chocolate agora?"
Mello testou a temperatura tocando o líquido com o dedo. Ainda estava quente mas não o suficiente para queimar.
"Pode," ele disse empurrando a xícara para ela.
Sofia pegou a xícara com as duas mãos e tomou um gole grande. Chocolate ficou ao redor da boca dela. Mello pegou um guardanapo e limpou.
Randal continuou observando. Parecia estar catalogando cada interação entre Mello e Sofia. Analisando a dinâmica entre eles.
"Ela te chama de mamãe," Randal observou.
"Sim."
"Por que mamãe e não papai?"
Mello deu de ombros.
"Ela começou a chamar quando tinha dois anos. Mamãe foi a primeira palavra que ela falou claramente. Tentei corrigir no início mas ela insistiu. Eventualmente parei de tentar."
"E isso não te incomoda?"
"Por que incomodaria?"
Randal não respondeu. Ele tomou outro gole do café antes de fazer a próxima pergunta:
"Onde você morava quando a encontrou? No mesmo apartamento que mora agora?"
Mello hesitou. Essa era uma pergunta complicada porque revelar que ele tinha se mudado várias vezes poderia levantar suspeitas sobre por que ele estava se escondendo.
"Morava em outro lugar," ele disse finalmente. "Me mudei algumas vezes nos últimos três anos."
"Por que?"
"Trabalho. Às vezes preciso estar em áreas diferentes da cidade."
Sofia tinha terminado o chocolate quente. Ela colocou a xícara na mesa e se virou no colo de Mello de forma que pudesse ver Randal melhor.
"Você tem o mesmo que eu," ela disse apontando para as marcas abaixo dos olhos de Randal.
Randal olhou para ela. Por um momento sua expressão amoleceu um pouco.
"Sim," ele respondeu. "Tenho."
"Por que?"
"Porque nascemos assim. É algo que algumas pessoas na minha família têm."
Sofia processou essa informação com a seriedade que apenas crianças de três anos conseguem ter quando estão tentando entender algo complexo.
"Eu sou da sua família?"
Randal hesitou antes de responder.
"Talvez. Vamos descobrir em alguns dias."
Sofia aceitou essa resposta e se virou de volta para Mello. Ela estava ficando entediada de verdade agora. Começou a se mexer no colo dele e puxar a camisa.
"Quero ir embora," ela disse. "Já terminamos?"
"Quase," Mello respondeu segurando ela no lugar.
Randal tirou o celular do bolso e verificou algo na tela. A expressão dele mudou ligeiramente enquanto lia.
"Recebi uma mensagem do investigador particular que contratei," ele disse guardando o celular. "Ele verificou seu histórico. Descobriu alguns detalhes interessantes."
Mello tinha esperado isso. Sabia que os documentos falsos não aguentariam uma investigação detalhada.
"Como o que?"
"Como o fato de que Mello não é seu nome real. Os documentos que você tem são todos falsos. Criados há aproximadamente três anos. Antes disso não há registro de você existindo."
Sofia começou a chorar baixinho. Estava cansada e queria ir embora. Mello a segurou tentando acalmá-la mas ela estava determinada a fazer birra agora.
"Quero ir para casa!" ela gritou.
"Sofia, precisa se acalmar," Mello disse.
"Não! Quero ir embora agora!"
As pessoas nas outras mesas começaram a olhar. Mello podia sentir os olhares julgadores.
Randal observou a situação por um momento antes de se levantar.
"Podemos continuar essa conversa em outro momento," ele disse. "Quando ela estiver mais calma."
Mello assentiu grato pela interrupção. Sofia estava chorando de verdade agora. Lágrimas descendo pelo rosto enquanto ela puxava a camisa dele tentando sair do café.
"Me leva embora! Quero ir embora!"
Mello se levantou mantendo ela no colo mesmo com ela tentando se debater. Ele começou a caminhar para a saída quando Randal falou de novo:
"Mello."
Ele parou e olhou para trás. Randal estava guardando a carteira no bolso. Tinha pago a conta enquanto Mello estava distraído com Sofia.
"Não me importo com seu passado," Randal disse. "Ou com quem você era antes de encontrar ela. Me importo apenas se você é uma ameaça para minha possível irmã. O investigador não encontrou nada nos últimos três anos que sugira que você seja perigoso. Isso é tudo que preciso saber por enquanto."
Mello não soube o que responder. Apenas assentiu e continuou caminhando para a saída com Sofia chorando no colo.
Eles estavam na rua quando o celular de Randal tocou. Mello estava tentando acalmar Sofia quando viu Randal atender a ligação atrás dele. A expressão de Randal mudou enquanto ele ouvia.
Ele desligou e caminhou rapidamente até onde Mello estava parado na calçada.
"Era do laboratório," Randal disse. O tom era neutro mas Mello podia detectar tensão por baixo. "Os resultados chegaram mais cedo que o esperado. Podemos ir buscar agora se quiser."
Sofia estava fazendo birra completa agora. Chorando e gritando que queria ir para casa. Ela tentou sair dos braços de Mello mas ele a segurou firme.
"Preciso acalmá-la primeiro," Mello disse.
"Podemos ir no meu carro," Randal ofereceu. "É mais confortável do que transporte público."
Sofia gritou mais alto.
"Não quero ir no carro! Quero ir para casa!"
Mello olhou para Randal e depois para Sofia que estava vermelha de tanto chorar. Os resultados estavam prontos. Depois de três anos ele finalmente ia descobrir com certeza se Sofia era uma Von Ivory.
"Tudo bem," ele concordou. "Mas ela vai no meu colo. Não vai aceitar sentar sozinha do jeito que está agora."
Randal assentiu e indicou um carro preto estacionado na rua. Um motorista estava esperando dentro.
Mello caminhou até o carro mantendo Sofia nos braços. Ela continuava chorando e tentando se debater. Ele entrou no banco de trás e se acomodou com ela no colo.
Randal entrou do outro lado e disse algo para o motorista. O carro começou a se mover.
Sofia chorou durante todo o caminho até o laboratório.
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