## Capítulo 7: O Abandono Branco
Mello assentiu, agradecido pela saída, e começou a se levantar, aliviado por ter desviado com sucesso a crise. Ele tinha virado o jogo. A ameaça de gravidez tinha se dissipado, substituída por algo que ele podia controlar: a narrativa de sua saúde frágil e a sensibilidade de seu corpo. Agora, ele tinha mais poder do que antes, pois exigia cuidados adicionais, ou assim pensava.
Ele se afastou lentamente de Dimitri e Boris, que já estavam discutindo a melhor forma de preparar o tônico de beterraba e se certificando de que Mello receberia mais porções de gordura e pão preto. A tenda-armazém era um labirinto de sacos, barris e caixotes, mas Mello conhecia o caminho para a saída. A satisfação de ter manipulado a situação era doce, quase inebriante. Ele havia usado o medo deles do Capitão Nyon e seu senso de profissionalismo médico contra eles. A jogada tinha sido arriscada, mas a recompensa foi a manutenção de seu estado de ‘protegida’ e o alívio imediato da pressão. Ele precisava de descanso depois desse estresse emocional.
Mello saiu da tenda, seu corpo tenso de vigilância relaxando um pouco. O ar frio o atingiu, um lembrete imediato do inverno implacável. O acampamento estava envolto em uma quietude estranha. Aquele silêncio não era o eco da paz, mas a preparação para a tempestade. A nevasca que Boris havia previsto havia chegado.
Ele caminhou de volta para a sua tenda, a que dividia com Sergey, o soldado cuja vida ele havia salvado (e que agora era seu guardião não oficial). O chão estava coberto por uma camada fina de neve fresca, mas o céu prometia muito mais. As nuvens estavam densas, cinzentas e pesadas, parecendo mal aghar o peso iminente.
Ao chegar na tenda, Sergey estava lá. O soldado ferido estava sentado em seu leito, limpando lentamente sua baioneta com um pano oleoso. Sua perna, que Mello havia ajudado a curar secretamente, ainda estava enfaixada para manter as aparências, mas ele já a apoiava no chão com mais firmeza.
Sergey levantou a cabeça quando Mello entrou, seus olhos azuis examinando-o.
“Dimitri estava te procurando,” Sergey disse, sua voz rouca. “Problemas?”
Mello tirou o casaco pesado, sacudindo a neve que havia acumulado em suas longas tranças loiras.
“Nada que não possa ser gerenciado,” Mello respondeu, mantendo a voz leve. Ele precisava deitar-se. A manipulação do tempo era um dreno constante, e o estresse da cena anterior o havia esgotado ainda mais.
Sergey apenas balançou a cabeça. Ele não parecia nem um pouco curioso, o que Mello apreciava. A discrição de Sergey era um alívio.
“Você parece pálida, Aimee. Coma,” instruiu Sergey, empurrando uma tigela de guisado de carne gorda que estava ao lado do fogão.
Mello se forçou a comer algumas colheradas, sentindo o peso da culpa. Ele havia acabado de mentir para Dimitri e Boris sobre sua fragilidade fisiológica, e agora tinha que atuar para Sergey. Este era o custo de sua servidão: nunca havia um momento em que ele pudesse ser apenas ele mesmo, Liu Nuan. Ele era Aimee, a frágil, a anômala, a curandeira.
Com o corpo pesado de exaustão e a cabeça cheia de estratégias para o futuro (ele precisava garantir que o próximo "ciclo" simulado viesse no tempo certo, ou a suspeita voltaria), Mello se dirigiu ao seu lugar habitual no chão da tenda, onde um monte de peles e cobertores ficavam empilhados. Não era uma cama de seda, mas era um abrigo contra a frieza cortante da estepe.
Enquanto se deitava, a quietude do acampamento o inundou. Sergey continuava o seu trabalho metódico com a baioneta; o único som era o crepitar do pequeno fogão a lenha no centro. A nevasca ainda não havia engolido o mundo com toda a sua fúria, mas a pressão atmosférica estava gritando que estava a caminho.
Mello fechou os olhos, buscando a concentração que o pincel lhe dava, o ponto central de calma. Mas sua mente estava muito agitada, o fluxo de *Qi* turvo pelo estresse repetido. Ele não podia entrar em um sono profundo, não agora. Ele precisava de um sono leve, vigiado, onde pudesse recarregar, mas ainda estar pronto para uma emergência.
Ele deve ter cochilado por alguns minutos, o peso das preocupações o puxando para baixo.
Foi então que aconteceu.
Não foi um som que o despertou. Foi uma luz.
Um brilho fraco e incomum começou a penetrar a lona espessa da tenda. Não era a luz amarelada dos lampiões de querosene; era uma cor azul-esbranquiçada fria, quase fantasmagórica. Era suave, pulsante, e estava emanando de baixo, perto do chão.
Mello abriu os olhos abruptamente. Sergey também notou, sua mão parando no meio do movimento de limpeza da baioneta.
“O que é isso?” Sergey murmurou, sua voz era grave de desconfiança. No ambiente militar, qualquer anomalia no escuro ou na paisagem de guerra era um sinal de perigo imediato.
A luz dançava, como se estivesse flutuando um palmo acima da neve lá fora. Ela se movia lentamente, um farol suave na escuridão crescente do dia. A cor era hipnotizante — tão pura. *Jing*. *Qi*. Era uma ressonância com a sua própria natureza temporal, ele percebeu.
Mello se levantou de um salto, uma eletricidade percorrendo seu corpo exausto. Este não era o tipo de luz que vinha de um lampião; aquilo parecia… energia pura, ou talvez um tipo de fenômeno natural amplificado pelo frio extremo. Mas ele nunca tinha visto nada parecido. Era como um reflexo de gelo, mas com uma vida própria.
“Fique aqui,” Mello disse a Sergey, sua voz era baixa de urgência.
“Aimee, você não vai sair. Nyon disse para você ficar protegida,” Sergey protestou, mas ele não se movia. A baioneta na mão era o seu foco.
“Eu só preciso ver o que é,” Mello disse, já puxando a pele que servia como porta da tenda.
O ar frio o atingiu com a força de um soco. Ele não se deu ao trabalho de pegar seu casaco. O impulso era muito forte.
A luz não era uma ilusão. Ela estava flutuando a poucos metros da tenda, uma esfera suave de luminosidade azul-gelo. Ela se movia em direção ao perímetro do acampamento, em direção ao cinturão de árvores que marcava o início da floresta.
Mello, cauteloso, mas intensamente intrigado, seguiu. Ele deu passos na neve compactada, evitando fazer barulho. Ele estava exausto, confuso com a situação médica anterior, e agora esta luz misteriosa. Por que ela estava aqui, agora?
A luz parecia convidá-lo. *Venha, Aimee. Venha, Liu Nuan.* A voz em sua mente não era audível, mas a ressonância era poderosa, um sussurro no âmago de seu poder. Parecia familiar, como se estivesse chamando aspectos de sua antiga vida que ele havia reprimido.
Ele se afastou das outras tendas. O acampamento estava anormalmente silencioso. Os outros soldados estavam provavelmente aquecidos em suas tendas, esperando o pico da nevasca. A nevasca era uma inimiga mais brutal do que qualquer exército chinês.
Mello seguiu a luz, que flutuava como uma lanterna de papel, sempre a apenas um passo de distância. A ansiedade aumentava a cada passo que ele dava. Ele estava se afastando da segurança das chamas, do calor humano.
A luz o levou para a borda da floresta. As árvores de pinho, carregadas de neve, pareciam espectros no crepúsculo que se aprofundava. O contraste entre o azul brilhante da esfera de luz e o branco imponente e ameaçador da floresta era assustador.
Foi ali, no limiar da escuridão e do desconhecido, que Mello hesitou.
Sua mãe havia lhe ensinado a reverência. A servidão o havia mantido seguro. A humildade era o seu escudo. Mas a impulsividade sempre foi o seu maior erro, a falha que o havia tirado do calor de sua casa e o jogado na nevasca da guerra. E o que era *aquilo* senão um chamado para a impulsividade? Uma curiosidade que beirava a imprudência.
Ele sentiu o perigo. A luz era bela, sim, mas a floresta era um cemitério coberto de neve, um lugar onde a linha entre vida e morte era tênue.
*Liu Nuan, você está longe demais.*
A voz de sua mãe, a voz de seu treinamento, ecoou em sua mente. O pacto dos deuses exigia servir para manter o poder, não seguir luzes misteriosas na noite.
Ele parou, respirou fundo, e a névoa de sua respiração congelou no ar. A luz azul-esbranquiçada parou também, como se estivesse esperando por ele.
Ele se virou. O acampamento estava a apenas algumas dezenas de metros, mas parecia muito mais distante. Ele podia ver a silhueta das tendas, o leve brilho laranja que emanava da lareira de Nyon.
“Não,” Mello murmurou para si mesmo. “Eu não posso. Eu preciso voltar.”
Servir. Voltar. Recuar para a tenda e para a sua rotina auto-imposta. Isso era disciplina.
Ele começou a caminhar de volta. Mas a nevasca iminente estava se movendo mais rápido do que ele.
Em meros segundos, Mello percebeu que havia cometido um erro terrível. O vento, que antes era uma brisa gelada, agora soprava com a força de um chicote, erguendo a neve do chão em um véu cegante.
A fina camada de neve fresca que cobria as pegadas que ele havia feito estava sendo apagada com uma rapidez alarmante. O ar ficou turvo, denso com flocos de gelo que picavam a pele desprotegida de seu rosto.
Mello tentou acelerar o passo, mas a direção se tornou uma suposição. *Onde estava a tenda?*
A esfera azul ainda estava lá, um ponto de luz, mas agora parecia menos um guia e mais um espectador zombeteiro.
Ele virou o corpo completamente, tentando se orientar por qualquer coisa familiar. As tendas... elas deveriam estar bem ali!
Ele entrou em pânico. Não conseguia localizar a tenda onde Sergey estava. A nevasca, em sua chegada repentina e brutal, havia transformado a paisagem. O branco era total, esmagador.
Ele andou mais alguns passos, tateando a neblina gelada. Ele não conseguia ver as marcas de seu caminho. A neve estava caindo tão rápido que qualquer rastro era imediatamente enterrado. A sensação de estar completamente perdido, a apenas algumas dezenas de metros da segurança, era paralisante.
Ele estava em meio à vasta e indistinguível floresta congelada, apesar de estar na borda. A borda da floresta, que parecia tão ameaçadora, agora servia como o único ponto de referência, mas ele não podia se afastar dela sem se perder completamente na brancura do acampamento.
Ele deu um grito, um som abafado que o vento roubou imediatamente. Ninguém o ouviria.
A adrenalina de Mello, que o havia sustentado durante semanas de manipulação mental e cura exaustiva, estava se esvaindo, substituída por um desespero frio. Este era o perigo que a floresta prometia, e ele tinha caminhado direto para ele.
Ele notou o aumento da intensidade do vento. O som era um rugido baixo e ameaçador. A neve caía, não em flocos, mas em uma cortina firme. A temperatura parecia ter despencado em um instante. A nevasca estava alcançando o seu auge.
*Você deve ser encontrado. Agora.*
O pensamento era urgente. Se ele ficasse ali, seria enterrado em minutos. Congelado até a morte. A neve seria seu túmulo e cobriria seu erro estúpido e impulsivo.
A utilidade de Aimee para Nyon não significaria nada se ela fosse encontrada como um bloco de gelo na manhã seguinte.
Em um ato de desespero, Mello colocou as mãos nas roupas que estava vestindo. Ele estava de calças e uma blusa de seda que usava por baixo do casaco, um lembrete de seu disfarce feminino. Não eram roupas de explorador. O frio já estava penetrando, paralisando seus dedos.
Ele precisava de um sinal. Algo que fosse visível, algo que se destacasse no branco avassalador.
Ele tateou a cintura, onde havia costurado um pequeno bolso interno em suas calças. Dentro, ele guardava algumas moedas de sua China natal e, mais importante, uma pequena navalha que havia roubado de um kit de primeiros socorros de Dimitri. Ele a usava para cortar as ervas de seu incenso improvisado e manter a barba que nunca crescia sob controle.
Com os dedos quase dormentes, ele conseguiu puxar a navalha. A lâmina era fria e pequena.
Ele olhou para o único recurso que ele tinha que era totalmente anômalo, totalmente único na paisagem: seu cabelo.
Seu cabelo loiro dourado, longo, que descia até a cintura e que havia sido a sua maldição na China, atraindo pretendentes indesejados. Seu cabelo, que ele mantinha trançado e oculto sob as roupas russas quando estava trabalhando. Ele o havia soltado um pouco para a caligrafia, e era glorioso, um ponto de cor irreal contra a pele pálida.
Mello levou a navalha para um lado de sua cabeça. A mão tremeu. Ele nunca, jamais, havia cortado o cabelo. Era seu tesouro, sua chave para a persona de Aimee. Sua mãe o havia criado para mantê-lo longo e sedutor. Destruir isso era quase tão impensável quanto revelar seus poderes.
Mas o instinto de sobrevivência era mais forte do que a vaidade ou o disfarce.
Ele enfiou a navalha, fria e pequena, nas sedosas mechas de cabelo. E puxou.
O som do corte foi angustiante, um rasgar na quietude do vento. Ele cortou mechas grossas, sem se preocupar com a simetria ou o comprimento. A navalha não era ideal para isso, mas ele persistiu, cortando rapidamente três grandes porções de cabelo, que caíram em suas mãos.
Agora tinha um punhado de ouro brilhante e vivo, uma cor que gritava contra o fundo monocromático da nevasca.
Ele jogou a navalha de volta para o bolso. Ele juntou o cabelo em uma mão e o ergueu acima da cabeça, permitindo que a nevasca e o vento rasgassem os fragmentos dourados de seus dedos.
O vento os pegou.
Os fios de cabelo loiro, agora fragmentos de ouro puro, voaram no ar. Eles se moveram erraticamente por um momento, mas a cor era inconfundível. Eles não pareciam cabelo, pareciam pequenas e brilhantes bandeiras, contrastando fortemente com a negrura da floresta e a brancura da neve.
Se alguém estivesse procurando, se alguém passasse por ali, eles veriam o brilho. O amarelo dourado no azul e branco.
Mello assistiu por um momento, a respiração presa na garganta, enquanto a nevasca engolia o seu sinal de socorro.
Ele estava envergonhado e humilhado. Patético. Ele estava sentado na neve, os joelhos dobrados, o corpo tremendo, o cabelo desbastado. Ele trocou meses de servidão e discrição por um momento estúpido de curiosidade e agora estava pagando o custo com a sua dignidade e a sua identidade.
Ele ficou ali, esperando. Resignado com as consequências de sua impulsividade.
A luz azul-esbranquiçada que o havia atraído havia se dissipado, ou talvez a neve a tivesse coberto. Ele não estava mais olhando para ela. Ele estava apenas esperando. Esperando para congelar, ou ser encontrado por um explorador russo ou, pior, chinês.
O tempo se arrastou. O frio não doía mais, e isso era um sinal perigoso. O corpo de Mello estava entrando em uma fase de desespero. Seus músculos tremiam incontrolavelmente, mas ele estava começando a sentir um calor interno, o calor falso que o congelamento trazia.
Ele tentou fazer circular o seu *Qi*, mas o esforço foi grande, e ele temia drenar completamente suas reservas. A cura exigiria *tudo* dele, e ele precisava ser encontrado vivo primeiro.
Mello fechou os olhos, concentrando-se em manter o coração batendo e o sangue circulando, focando apenas no *ser*, não no *fazer*.
De repente, ele sentiu uma vibração na neve. Não era do vento, era um peso. Pesado demais para um animal selvagem.
Mello abriu os olhos abruptamente. A nevasca estava tão intensa que ele teve que piscar várias vezes para distinguir a forma escura que se aproximava.
A forma era enorme. Inacreditavelmente alta, muito mais alta do que qualquer soldado que ele havia visto no acampamento. O homem surgiu repentinamente do lado oposto ao que ele tentava seguir, ignorando completamente a área onde Mello havia jogado os fragmentos de cabelo. Ele veio da profundidade da floresta, como se o frio fosse o seu habitat natural.
Ele tinha a altura de Nyon, mas era muito mais largo. E a sua aparência era chocante.
Ele era albino.
O homem era musculoso de uma forma quase grotesca, totalmente coberto por peles escuras e armadura de couro grosso que parecia uma segunda pele. Seus olhos eram de um vermelho intenso, quase magenta, e sua pele era pálida como a neve, coberta por marcas de batalha e cicatrizes que pareciam ter congelado em sua face.
Ele não era claramente russo, e certamente não era chinês. Ele era diferente. Estranho. Um fantasma da floresta.
Mello congelou, não mais pelo frio, mas pelo terror.
O homem parou a alguns metros de Mello, olhando para ele. Seu rosto era um estudo de indiferença brutal.
Mello não teve tempo de reagir. O gigante deu dois passos rápidos e maciços.
Em um instante, Mello se sentiu içado com a força de um urso. O homem albino não falou. Ele agarrou Mello pelo pescoço, o aperto era firme, mas não esmagador. Ele o ergueu no ar sem esforço.
Mello guinchou, lutando para respirar. Seu *Qi* estava esgotado para lutar contra uma criatura de tal força bruta. Ele estava indefeso.
Ele tentou se mover, a navalha em seu bolso parecendo um brinquedo inútil contra aquela montanha de músculos.
O homem albino, no entanto, não pareceu ver Mello como uma ameaça. Ele o segurava como se estivesse examinando uma presa curiosa. Seus olhos vermelhos perfuravam Mello, analisando cada detalhe.
Foi a sua aparência que o salvou.
O homem albino olhou para as roupas de Mello. A blusa de seda rasgada, a capa de pele de cordeiro que ele vestia por baixo. A maneira como as roupas estavam cortadas e improvisadas por Boris para parecerem femininas. A maneira como Mello estava pálido e com medo, sua figura esguia parecendo ainda mais frágil.
Então, os olhos do homem caíram sobre o pedaço de tecido que Mello usava em uma das tranças restantes – um pedaço de fita vermelha e azul que Dimitri havia dado a ele para “decorar” seu cabelo, que parecia um fragmento da bandeira russa militar.
O aperto em seu pescoço cessou. O homem não o soltou, mas a pressão se transformou de uma ameaça de morte em um segurar.
Ele baixou Mello suavemente até o nível do seu peito. Mello podia sentir o calor se irradiando do corpo do homem, um calor que parecia sobrenatural contra a temperatura congelante.
O homem albino o segurou no colo, na neve. Não havia malícia em seus olhos agora, mas sim uma surpresa cautelosa.
A voz do homem, quando ele finalmente falou, era gutural e profunda, em um russo pesado e cheio de sibilantes que Mello mal conseguia entender. Não era o russo culto de Nyon, nem o sotaque eslavo comum. Era de algum lugar mais profundo, mais antigo.
“O que… você é?” o homem perguntou, sua respiração estava quente contra o topo da cabeça de Mello.
Seus grandes dedos seguravam Mello com uma ternura inesperada. Ele parecia ter percebido que Mello era fraco e não era uma ameaça.
Mello estava lutando para respirar, o choque do susto o havia atingido. Ele era Aimee. Ele tinha que ser Aimee. A frágil e indefesa protegida.
“Aimee,” Mello sussurrou, a sua voz era rouca e trêmula, a voz que ele havia aperfeiçoado para a servidão de Nyon.
O homem balançou a cabeça ligeiramente, como se estivesse assimilando a palavra incomum.
“Aimee,” ele repetiu, a pronúncia estava errada.
Mello tentou responder novamente, mas a exaustão acumulada, o frio, o choque do encontro, e o estresse da última hora de manipulação mental eram demais. Ele sentiu o corpo ceder, o calor do homem albino era o único conforto em um mundo que estava ficando distorcido.
A visão de Mello escureceu completamente, e ele desmaiou.
Comments (0)
No comments yet. Be the first to share your thoughts!