Chapter 1: O Despertar no Inimigo
O primeiro sinal de consciência foi uma dor lancinante na têmpora, um pulsar rítmico que ecoava na caixa craniana vazia. Mello gemeu, o som estranhamente abafado, e seus olhos se moveram sob as pálpebras pesadas antes de se abrirem em fendas confusas.
Tinha que ter frio, muito frio. A última coisa que Mello lembrava era a picada glacial da neve nas suas bochechas e a sensação paralisante de que seus membros estavam se transformando em pedra. Ele tinha fugido, um ato de tola indignação depois da piada sarcástica do irmão, e a nevasca o tinha tragado como uma boca faminta.
Mas o que Mello sentia agora era... calor. Não o calor sufocante e seco de um dia de verão, mas um calor envolvente e reconfortante, como estar embrulhado na manta mais grossa que sua mãe guardava para os invernos terríveis. Seu corpo, embora ainda dolorido e pesado, parecia ter voltado à vida.
O cheiro era de pinho e fumaça de madeira, um aroma forte e rústico que não tinha nada a ver com o acampamento chinês. Mello tentou se levantar, mas uma onda de vertigem o atingiu, forçando-o a afundar de volta no colchão improvisado. Ele estava deitado em algo macio, coberto por peles pesadas.
Com um esforço, ele virou a cabeça. Estava dentro de uma barraca, definitivamente uma tenda militar, mas não as que Mello conhecia. Esta era maior, mais reforçada, com lonas grossas que bloqueavam o som da tempestade lá fora. A luz vinha de uma lamparina a óleo suspensa, lançando sombras dançantes nas paredes.
E então Mello o viu.
Ali, debruçado sobre uma pequena mesa improvisada perto da luz, estava um homem de uniforme. Um uniforme verde-escuro, quase preto na fraca iluminação, com detalhes que Mello soube imediatamente serem russos. Ele estava examinando tiras de tecido ensanguentadas e frascos de vidro, e sua expressão... bem, não era amigável.
O homem era de estatura média, mas parecia maior dentro daquela tenda pequena. Seu rosto era angular, sobressaindo sob um chapéu de pele que ele não tinha tirado. Olhos azuis — tão frios quanto o gelo lá fora — pairavam sobre os objetos, e a testa franzida denotava uma grande impaciência. Ele era o epítome de um oficial militar, rígido e austero.
Ao seu lado, um rifle encostado na lona parecia um cão de guarda silencioso.
O pânico começou a subir pela garganta de Mello. Inimigos. Eles eram os inimigos.
*Servir.*
A palavra ressoou na sua mente como um sino de alívio e advertência. Sua mãe tinha sido clara: a manutenção do seu poder divino – a manipulação do tempo e a capacidade de curar – estava diretamente ligada à sua humildade e ao ato de servir a outro. Foi por isso que ele tinha que agir como mulher, para facilitar essa subserviência.
Agora, ele estava sob o teto do inimigo, em uma situação de vulnerabilidade extrema. Seus poderes, que ele tinha negligenciado e usado de forma impulsiva na nevasca, estavam fracos, quase inaudíveis. Ele tinha que agir, e rápido, para encontrar uma maneira de se encaixar, de ser útil.
Enquanto Mello processava a situação e tentava acalmar o coração acelerado, o homem russo levantou a cabeça. Seus olhos gélidos encontraram os de Mello, e a expressão do rosto do homem não mudou. Ele apenas piscou, como se tivesse encontrado um inseto que esperava esmagar.
Ele não se moveu, apenas observou Mello por um longo momento, avaliando-o. O silêncio esticou-se, pesado e opressor.
Finalmente, o oficial, que Mello logo assumiu ser um médico pelo que estava manipulando, largou o que estava fazendo. O som do vidro batendo na mesa ressoou na tenda.
"Ah, você acordou," disse o russo. Sua voz era profunda e rouca, um som que parecia ter viajado longas distâncias, e ele falava em um mandarim que, embora áspero e com sotaque pesado, era perfeitamente inteligível. Mello ficou surpreso.
1. Mello desperta confuso e com a cabeça latejando, notando imediatamente a tenda quente e a presença de um homem de uniforme militar russo verde examinando seus ferimentos.
O homem se aproximou da cama de campanha de Mello. A rigidez de seus ombros era palpável. Ele esticou a mão e tocou a testa de Mello, verificando a temperatura. Seu toque era inesperadamente profissional, mas sem qualquer calor humano.
"Febre desapareceu. Você é incrivelmente fraco. Quatro dias. Quatro dias que achei que teríamos que descartar você," ele murmurou, mais para si mesmo do que para Mello.
"O-onde..." Mello tentou perguntar, mas sua garganta estava seca e sua voz mal passava de um sussurro arranhado.
2. O Dr. Dimitri, um homem severo, inicia um questionamento imediato e áspero focando na palidez extrema de Mello e na incongruência de seus cabelos loiros com sua aparência chinesa.
O russo não respondeu à pergunta. Ele recuou e se colocou em uma pose mais autoritária.
"Dr. Dimitri," ele se apresentou, sem nenhuma cordialidade. "Agora você responde. E não minta. Minha paciência se esgotou há dois dias e meio, e mal consigo tolerar sua presença aqui."
Dimitri pegou um pequeno caderno e uma caneta da mesa. Sua caneta arranhou o papel antes que ele voltasse a olhar para Mello, e Mello sentiu-se como um espécime de laboratório sendo analisado.
"Você é uma aberração, garoto. Tão pálido quanto a neve que quase o matou. Sua pele é frágil, e você não tem o rosto da China do Norte. Mas seu sotaque e as vestes que rasguei indicam que você veio de lá."
O olhar de Dimitri se intensificou, direcionado especificamente para o topo da cabeça de Mello.
Os cabelos.
Mello sentiu um arrepio pelo corpo, ignorando a dor. Em sua aldeia, seu cabelo era seu fardo e sua bênção. Era loiro, não um tom de palha ou areia, mas um dourado cintilante que parecia emitir luz própria. Era um presente dos deuses junto com seus poderes, algo único que o destacava de todos os outros chineses de cabelos escuros da sua região. Era a razão de sua beleza e de ele ter sido forçado a manter o disfarce feminino para evitar ser caçado por sua singularidade e seus poderes.
"E o cabelo," Dimitri sibilou, sua voz cheia de desconfiança ácida. "Um tom irreal. Não é tingido, examinei. Não é natural para seu povo. Explique isso. Quem é você, e o que uma criatura frágil como você estava fazendo sozinha no meio da nevasca, em uma zona de combate, quase no lado russo da fronteira?"
O tom não era de curiosidade, era de acusação. Dimitri estava exigindo a verdade enquanto já decidia que Mello era uma mentira.
Mello tentou engolir, mas sua garganta ainda estava muito seca. Ele sentiu o peso dos olhos de Dimitri, o julgamento de seu povo refletido no olhar do inimigo.
*Lembre-se do treinamento. Fragilidade. Inocência. Servir.*
Ele tinha que ser Aimee. A donzela pálida e bela, perdida e assustada, não o mestre dos poderes temporais que tinha agido por orgulho estúpido.
3. Mello tenta responder com voz fraca, mantendo a fachada de fragilidade e tentando desviar o foco do interrogatório sobre como chegou à área de combate.
Mello baixou as pálpebras por um momento, forçando um tremor nos lábios. Quando ele falou, a voz era deliberadamente mais alta do que o sussurro anterior, mas mantida no tom agudo e suave que ele tinha praticado por anos. Parecia tão estranha para ele agora, tão feminina, mas era necessário.
"Eu... sou Aimee," ele murmurou, usando o nome que sua mãe tinha escolhido para ele na aldeia. "Eu... eu estava com meu irmão. Nós estávamos viajando, quando a guerra começou. Eu me perdi. Acho que me perdi na tempestade..."
Mello evitou mencionar a "guerra de espadas" ou o motivo de ele estar na linha de frente, ou a discussão com o irmão. Aqueles eram detalhes perigosos demais. Ele se concentrou na confusão e na dor. Ele fez uma pausa, tossindo levemente para dar ênfase à sua fraqueza.
"Meu cabelo... é meu. Eu sou... incomum. Minha mãe dizia que era um presente de família, embora ninguém mais o tivesse assim. Eu sou da província de Shaanxi. Meu pai era um comerciante. Nós fugimos da cidade quando... quando as coisas ficaram muito ruins."
Ele estava mentindo sobre os detalhes, claro, mas a essência – estar perdido, ser frágil – era o que importava. Aimee precisava de proteção. Aimee precisava de alguém para servir.
Dimitri balançou a cabeça com impaciência.
"Comerciantes, hã? Na linha de frente da Frente de Inverno? Com uma garotinha que parece que nunca fez um trabalho pesado na vida? Inacreditável. E seu irmão? Onde ele está agora, seu protetor? Por que ele não estava procurando por sua joia de cabelo dourado?"
Mello sentiu a pressão. Ele engoliu em seco. "Eu me separei dele. Houve... uma confusão. Eu... eu não sei onde ele está. Eu só sei que de repente, a neve estava alta, e eu caí. E então, eu acordei aqui."
Ele tentou parecer o mais assustado e desamparado possível, seus olhos grandes e ligeiramente lacrimosos, fixos em Dimitri. Ele percebeu que a melhor defesa contra o interrogatório severo era ser tão desnecessariamente complicado e fraco que o médico mal-humorado quisesse se livrar dele.
Dimitri fechou os olhos por um momento, massageando a ponte do nariz. Sua frustração era palpável, e Mello sabia que sua aparência incomum, embora útil para o disfarce de "beleza exótica", também era um grande inconveniente para o oficial pragmático. Eles não precisavam de um fardo na linha de frente.
"Eu não acredito em uma palavra. Sua história fede a desculpas para crianças," Dimitri resmungou. "Você é um espião. Ou alguma isca. Ninguém viaja com um cabelo assim sem um motivo. Um isopor brilhante no campo de neve."
Mello estremeceu, fingindo-se ofendido, mas também temeroso. "Eu só estou grata por estar viva, senhor. Quem foi... quem foi que me resgatou?"
Antes que Dimitri pudesse responder com seu inevitável ceticismo, a lona da porta da tenda foi jogada para o lado bruscamente. Uma rajada de ar gelado irrompeu, fazendo a lamparina piscar e as sombras dançarem como loucas.
4. Um soldado russo corpulento, Boris, entra na tenda e interrompe o interrogatório, mostrando curiosidade genuína, mas respeitosa, sobreo garoto.
Um homem enorme entrou na tenda. Ele era o oposto visual de Dimitri: robusto, com bochechas vermelhas do frio e um bigode espesso coberto de cristais de gelo. Sua armadura era simples, mas ele emanava uma aura de força e boa natureza. Ele ofegava ligeiramente, como se tivesse acabado de vir de um trabalho pesado.
"Doutor! O Capitão Nyon me enviou para verificar o estado da garota," o homem disse em russo alto, antes de se forçar a uma versão mais lenta e trabalhada do mandarim.
"Você acordou, finalmente! O Capitão estava preocupado. Pensei que você nunca acordaria. Meu nome é Boris," ele disse, com um sorriso largo e surpreendentemente gentil. Seus olhos se arregalaram um pouco quando ele viu Aimee (Mello) pálida, com o cabelo loiro espalhado no travesseiro improvisado, mas não havia julgamento, apenas uma genuína surpresa.
Dimitri soltou um suspiro estrondoso de aborrecimento. "Boris, você não está vendo que estou no meio de um interrogatório? Ela é possivelmente uma espiã!"
Boris, o soldado corpulento, parecia não ter ouvido. Ele se aproximou da cama, cuidadosamente para não intimidar, mas sua mera presença parecia encher a tenda. Ele inspecionou Mello com um olhar suave.
"Você parece melhor. Quase não parece que o gelo estava começando a entrar nos seus ossos. É verdade o que o Capitão Nyon disse... você é... muito impressionante de se ver."
O tom de Boris era de admiração simples, desprovido da conotação lasciva que muitos homens de seu status teriam usado. Era a curiosidade de quem via algo raro e se maravilhava com ele.
Mello sentiu um pequeno calor no peito. Era a primeira vez que alguém, especialmente um estranho e um inimigo, o olhava sem inveja ou desconfiança. Era o tipo de aceitação que facilitaria sua missão de "servir".
5. Dimitri expressa sua desconfiança sobre a presença de Mello, mas Boris o ignora, garantindo a Mello que ele está seguro, citando a proteção de Nyon.
Dimitri bateu a caneta na mesa, furioso por ter sido ignorado.
"Ela é perigosa, Boris! Se ela estava perdida, por que tão perto de um de nossos postos avançados de patrulha? Ela mente sobre tudo que dissemos – sua aparência, seu propósito. O Capitão está sendo ingênuo ao permitir que essa—essa figura estranha fique aqui! Nós estamos em guerra!"
Boris endireitou seu grosso casaco de pele. Ele deu de ombros com uma calma irritante.
"Guerra," ele concordou, "mas não contra mulheres perdidas, Doutor. E, honestamente, eu não acho que mesmo o exército chinês seria estúpido o suficiente para enviar uma garota pálida e fraca como—" ele parou, procurando a palavra certa em mandarim, "—como esta, para espionar nossos movimentos. Ela congelaria antes de andar metade de um quilômetro."
Ele sorriu para Mello, um sorriso que aquecia o ambiente.
"Não se preocupe, pequena. Enquanto estivermos aqui, você está segura. Nyon não permitiria que nada de ruim acontecesse a quem ele resgata. Ele tem... um jeito especial com aqueles que precisam de ajuda."
O nome "Nyon" pairava no ar, carregado de reverência por parte de Boris e de óbvio desdém por parte de Dimitri.
6. Boris explica que Nyon, o Capitão, encontrou ele quase morto na neve e o trouxe por ter um bom pressentimento, e que a reputação de sorte de Nyon impediu qualquer questionamento.
"Foi Nyon que a encontrou," Boris continuou, passando por cima do silêncio frio de Dimitri. "Ele estava liderando uma patrulha de reconhecimento quando a tempestade começou a diminuir um pouco, há quatro dias. Você estava enterrada na neve, quase uma estátua de gelo. Qualquer outro teria passado direto, pensando que era apenas um corpo para o urso. Mas Nyon... ele tem um olho para essas coisas."
Mello ouviu, absorvendo cada palavra. O Capitão Nyon. Um homem que arriscaria a segurança de sua patrulha por um estranho congelado na neve. Um líder que parecia ter alguma intuição para as coisas.
"Ele disse que tinha um 'bom pressentimento'. Não de dever, mas de... certeza. Que precisava te levar de volta. E quando Nyon diz que precisa fazer algo, geralmente é... bom para todos nós."
Boris inclinou-se um pouco, baixando a voz como se estivesse compartilhando um segredo vital, embora Dimitri ainda estivesse ali, bufando.
"Você deve saber, Aimee," ele usou o nome de Mello com facilidade. "O Capitão Nyon não é um homem comum. Ele tem uma reputação. Todos nós o seguimos porque ele tem uma sorte incrível. Nunca perdemos um homem sob seu comando, nunca fomos flanqueados pelas forças chinesas. A sorte dele é lendária. E ele disse que você era um bom presságio, uma bênção que a neve nos deu."
Mello processou isso rapidamente. Sorte lendária? Uma crença inabalável em bons presságios? Isso era exatamente o que ele precisava. Um homem de fé, até mesmo em suas próprias superstições. Alguém forte, cujos sucessos garantiam que ele seria servido e seguido.
"Portanto, quando Nyon diz para trazer a garota de cabelos dourados para dentro, mesmo que Dimitri reclame que você consome preciosos suprimentos médicos," Boris lançou um olhar significativo para o médico exasperado, "ninguém questiona. Ninguém ousaria estragar o presságio de sorte do Capitão."
Dimitri se levantou, batendo a cadeira no chão com força.
"Eu não estou reclamando dos suprimentos, Boris! Estou argumentando a favor da segurança operacional em tempo de guerra!" ele gritou, voltando para o russo.
"Sim, sim, seu argumento de sempre," Boris interrompeu, revirando os olhos. Ele voltou sua atenção para Mello, ignorando completamente o médico resmungando.
7. Mello, aliviado, agradece a Boris pelo resgate enquanto Boris tranquiliza Mello, revelando que Nyon tinha ameaçado cortar a mão de quem ousasse tocar em "ela" desnecessariamente.
O alívio de Mello era genuíno agora. Ele tinha um propósito e uma aceitação. Ele não precisava lutar. Ele não precisava curar. Ele só precisava servir ao homem que o tinha salvado e, indiretamente, garantido a manutenção de seus poderes.
"Eu... sou muito grato, Boris. Agradeço a você e ao Capitão Nyon. Vocês salvaram minha vida," Mello/Aimee disse, e sua voz feminina soou mais sinceridade do que qualquer outra coisa que ele tinha dito até agora.
Boris acenou com a cabeça. "É o nosso Capitão. Mas não se preocupe com mais nada. Você está protegida. E você está debaixo de ordens estritas para ser tratada com respeito. Nyon foi... muito direto sobre isso. Quando ele te tirou das peles e percebeu que você estava vestida com roupas de viagem de alta qualidade, e não um soldado disfarçado, ele... bem."
Boris fez uma pausa, olhando para Dimitri, que estava ocupado organizando seus instrumentos ruidosamente.
"Nyon disse—e eu cito—'Quem ousar tocar um fio de cabelo em sua cabeça, ou tocar nela sem que seja para salvá-la, perderá a mão.' O Capitão tem... um jeito de fazer as pessoas obedecerem. Então, relaxe. Ninguém vai te machucar aqui."
Essa ameaça impressionante e o zelo protetor de Nyon enviaram um arrepio pela espinha de Mello. Era a proteção que sua mãe havia procurado ao forçá-lo ao disfarce feminino. Essa autoridade irredutível era o que faltava em seu próprio acampamento, onde seu irmão ignorava seu apelo.
Nyon não apenas o salvou, ele o reivindicou.
8. Agradecido, Mello confirma que seu nome é Aimee, o nome falso que usava em sua aldeia para manter o disfarce feminino.
Mello sorriu levemente para Boris. Foi o primeiro sorriso real que ele tinha expressado em dias.
"Aimee," ele repetiu, assegurando o disfarce. "Meu nome é Aimee, e eu sinceramente não sei como posso pagar esse resgate. Eu não sou um espiã, Boris. Eu só estava... perdida. E muito, muito assustada."
9. Boris demonstra satisfação com a atitude humilde e agradecida de Mello/Aimee, reforçando o bom senso de Nyon.
Boris inflou o peito com satisfação. "Eu sabia! Eu disse ao Capitão que você era uma boa pessoa. O Doutor só vê problemas, mas nós, pessoas normais, podemos ver a graça quando ela se manifesta. O Capitão Nyon tem um instinto que nunca falha. Ele sabia que você era um bom augúrio."
Ele se virou para Dimitri, com um olhar triunfante. "Está vendo, Doutor? Humildade e gratidão. Ela não é um espião. Ela é uma vítima. Nyon estava certo, como sempre."
Dimitri apenas grunhiu e murmurou algo sobre "feminino e manipulador," mas não contestou abertamente. O peso da autoridade de Nyon era muito grande, mesmo para sua teimosia médica.
Mello relaxou completamente, afundando nas peles. Ele tinha a proteção e o aceitamento de que precisava. Ele tinha sobrevivido por um milagre e agora tinha a chance de cumprir a exigência dos deuses.
10. Mello sente a necessidade de se aproximar de Nyon para servir e manter seus poderes, um instinto primordial de sobrevivência espiritual.
A sensação fraca em seu peito, o resquício de seus poderes, começou a se agitar, como se estivesse despertando em resposta à sua aceitação do destino. Para manter a capacidade de curar e manipular o tempo—o dom que o tornava mais do que um mero mortal—ele *tinha* que servir Nyon. Não era uma escolha; era uma condição para a sua própria existência e a integridade de seu ser. Sua mãe tinha incutido essa verdade nele desde a infância.
"Encontre alguém para servir. Humilhe-se. Ajude os necessitados. E seu poder nunca o abandonará."
Nyon, o Capitão sortudo e protetor, era a pessoa perfeita. Ele não era chinês, o que diminuía muito a probabilidade de ele ser questionado por sua aparência estranha ou de seu paradeiro ser rastreado. Ele tinha poder e seguia uma disciplina rigorosa, o que garantia que Aimee ficaria fora de perigos desnecessários.
Mello tinha que agradecê-lo. Mais do que isso, ele tinha que se apresentar para o serviço.
11. Mello, mantendo a voz suave e feminina, pergunta a Boris quando poderia conhecer Nyon para expressar sua gratidão pessoalmente.
Com foco renovado, Mello olhou para Boris. Ele suavizou ainda mais a voz para garantir que parecesse o mais respeitoso e delicado possível.
"Boris," Mello começou, seu tom era o de uma petição humilde. "Eu entendo que o Capitão Nyon deve ser um homem muito ocupado, especialmente com a guerra, mas... eu gostaria muito de expressar minha gratidão pessoalmente. Pelo que ele fez por mim. Ele salvou minha vida. Por favor, você poderia perguntar a ele... se eu poderia vê-lo. Quando eu estiver forte o suficiente para me levantar, é claro."
Mello fez questão de olhar para sua mão fraca e tremente, mostrando sua incapacidade atual, mas também sua intenção de se esforçar.
Era um movimento arriscado. Oferecer-se para ver o Capitão poderia ser interpretado como um interesse romântico ou, pior, uma armadilha. Mas Mello tinha que arriscar. Ele precisava de Nyon.
12. Boris promete intermediar o encontro, vendo isso como algo positivo e encorajador, encerrando a conversa inicial sobre o resgate.
Boris sorriu, seu rosto volumoso iluminado com aprovação.
"Claro, Aimee, claro. Essa é uma atitude muito gentil da sua parte. O Capitão está de volta de uma patrulha agressiva agora, mas ele vai gostar de ver que você está melhor. Ele é um homem de coração. Ele não te deixaria congelar só para ser esquecido. Eu vou falar com ele assim que ele cuidar das coisas."
Boris acenou com a cabeça, satisfeito. "Sim. Um encontro. Será bom para ele, ele precisa de um pouco de encorajamento positivo com toda a situação da linha de frente. E você precisa conhecer a pessoa que te deu uma segunda chance."
Ele se virou para sair, deixando para trás um Dimitri resmungando e uma tenda repentinamente mais fria, mas Mello sentiu um calor crescer em seu peito—não físico, mas espiritual. A missão estava clara. Ele estava no caminho certo.
"Eu o verei em breve, espero," Mello sussurrou enquanto Boris fechava a lona.
A porta se fechou. Ele esperaria por Nyon. Ele precisava servi-lo. Seus poderes dependiam disso.
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